*João Filipe da Mata
Quem já morou no exterior sabe que a
vida lá fora tem seus desafios. Alguns aparecem nos primeiros dias em
terras estrangeiras - como se diz pão de sal em inglês?, existe farmácia
24 horas? - e podem ser superados com um pouco de esforço. Mas e quando o que
incomoda é a solidão?
Sempre que vou falar do assunto, eu me
lembro da minha experiência no Oriente Médio. Solteiro, eu queria conhecer
gente - “os árabes são tão bonitos”, um amigo havia comentado. O difícil era
por onde começar se não existiam baladas gays e se os aplicativos de paquera
eram proibidos.
Lembro também das movimentadas ruas de
Xangai e da minha surpresa ao entender que era possível se sentir sozinho numa
cidade com 25 milhões de pessoas. Ali, o maior obstáculo era a língua. Não se
aprende mandarim em pouco tempo. E nem se constrói uma relação com meia dúzia
de frases.
Na Austrália, aprendi que as 13 horas de
fuso-horário fazem a distância até o Brasil parecer ainda maior. E whatsapp ou redes sociais nem sempre resolvem, pois se eu ligar para
os meus amigos com a espontaneidade tão boa e tão brasileira que nos conecta,
vou acordar todo mundo.
Desafios assim nem sempre têm solução.
Mas da dificuldade podem surgir bons aprendizados.
“Nos três primeiros meses, eu aceito
todos os convites que recebo”, me aconselhou uma colega de trabalho acostumada
à vida no exterior. A dica me ajudou a descobrir lugares e interagir com
pessoas que eu, sozinho, não conheceria.
A distância cultural que separa oriente
e ocidente me fez perceber como posso ser parecido com latinos e europeus
espalhados pelo mundo. Encontrei, assim, bons amigos na comunidade de
expatriados.
Saber que vou passar o final do ano com
meus irmãos ou que a amiga de Brasília vem me visitar em outubro me ensinou que
planejar pode ser uma forma eficaz de lidar com a saudade.
E se, mesmo com tudo isso, um pouco de
solidão acaba sendo inevitável, meu maior aprendizado foi entender que o
esforço de adaptação vale a pena e que, no final, o saldo é positivo.
*João
Filipe da Mata é escritor e vice-cônsul em Sydney, Austrália. Autor de
"Filho da Mãe", publicado pela editora Much, já morou na Eslovênia,
na Itália, nos Emirados Árabes, na China e no Sri Lanka.
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